Eu observava a rua, os carros a passar, o pasto da chácara em frente de casa, às vezes, olhava o céu, as nuvens, quem vem cá, quem vai para lá, apenas observando, pensativo. Olhava de dentro do quintal de minha casa, pelas grades do portão. Percebi surgir da braquiária do pasto da chácara, que distava apenas o atravessar da rua, que somente tem acostamento do lado onde moro e o intervalo das calçadas, um bando de Alma-de-gato.
O capim-do-pasto estava baixo, havia crescido apenas uns quinze a dezesseis centímetros e meio. Fiquei um pouco surpreso por não os ver chegarem em revoada, mas estarem ali, quietinhos sob o capim. A rua estava movimentada, além do tráfego de veículos, pedestres também passavam. A maioria do lado de minha casa, devido ao acostamento e à calçada que no outro lado não tem pavimento. Apesar das crescentes daninhas, poucas ainda, o espaço tinha sido capinado alguns dias atrás. Talvez uma semana ou duas. Então algumas pessoas passavam ali. Geralmente, as que caminhavam para o meu lado direito, que vinham andando na rua e subiam na calçada não calçada, devido aos carros. Escolhem fazer assim para não terem a surpresa de serem atropeladas pelas costas, não tendo possibilidade de tentarem se desviar. Como foi dito, me admirei com aquele bando de Rabo-de-palha, por não se espantar com o movimento, às vezes tão perto.
Alguns Pilós, em um pequeno esvoaço, pousaram na cerca de arame liso, outros apareceram caminhando, saindo do pasto e invadindo o local da calçada não calçada. Achei muito interessante, foi quase um: “Tam Dam!”, olhe nos aqui. Voltei minha atenção para aqueles pássaros. Os que estavam na cerca, que pouca altura tem, um metro e meio mais ou menos, com quatro arames lisos, esses, apenas mexiam a cabeça, o que me fez rir e lembrar da dancinha da cabeça do Fat Family. Os que estavam no chão, olhavam nos espaços da calçada não calçada, olhavam para as daninhas, para o chão capinado, pareciam pensar: — O que viemos fazer aqui? Aqui não terá alimento.
Permaneceram ali por um momento, parecia que eles estavam com o mesmo propósito que eu estava, apenas observando e pensando um pouco. Talvez estivessem me observando, não sei. Quem sabe estivessem inquirindo o meu proceder, vai lá se saber o que essas aves pensam.
Ouvi que se aproximava um veículo barulhento. Era uma D10, caminhonete do ano de 1983, em péssimo estado de conservação. Além do ronco do motor, o barulho da lataria batendo como se fosse desmontar a qualquer momento, só faltavam uns estalos no escapamento, para poder dizer que estava fundindo. Contudo, aquele bando de Quiriru não se perturbou nenhum pouquinho. Reparei que todos eles, sem exceção, olharam e não desviaram mais o olhar da charanga barulhenta. Ficaram prestando atenção até ela passar, como quem assiste da arquibancada de um autódromo os carros da Fórmula-1 passarem, movimentando a cabeça de um lado para o outro. Faziam isso conforme o tempo e a velocidade de passagem do veículo, que era vagaroso.
Eu, cada vez mais achando graça naquelas aves, vi passar um carro que estava um tanto rápido para o limite de velocidade permitido na via, então aquele bando de Pelincho, da mesma forma com que apareceram, saindo debaixo do capim, voltaram para lá. O que contrariou a ideia que eu tinha sobre como eles se retirariam dali. Julgava que alçariam voou ao céu, no mínimo, voariam e pousariam nos fios da rede de energia elétrica. Apenas um Piriguá permaneceu no chão da calçada não calçada, próximo a uma daninha. Pensei comigo. — Vamos ver o que esse Anu-branco vai fazer.
Ele estava na maior paz quando começou a se mover. Desconfiei daquele Piaya cayana. Os passos que ele dava revelavam a mansidão e tranquilidade com que se movia, parecia até ter consumindo algum inseto ou planta que lhe proporcionou um estado alucinógeno, tipo a cannabis sativa.
Andava para lá e para cá, rodeava uma daninha, vasculhava cada centímetro, fazia o mesmo trajeto, refazia o trajeto, agora voltando, vasculhando cuidadosamente, tudo de forma bem lenta. O que me fez hilariar em meus pensamentos, me levando a conjecturar os pensamentos do Guirá-acangatara, que depois de umas duas bicadas em uma e outra daninha, retornou na mansidão e tranquilidade para o pasto e se ocultou sob a braquiária dizendo:—
Pô mano, mó larica e a chepa aqui tá na encoia, acho que vou lá pro pasto de novo.
Esse foi o perquirir do Piririta da família Cuculidae.